volcano

por Akrura Bogéa

Yogod vivia em paz e muito tranquilo, num dos vales mais bonitos da região, com o seu belo rebanho de ovelhas. Ele era um homem solitário, ordenhava, tosquiava, tecia sua lã, fazia queijo e vendia seus produtos para a amistosa vizinhança. Yogod era um privilegiado, vivia num belo recanto da região, cercado de velhas oliveiras, cuidava do seu belo jardim nas horas livres, essa atividade de cuidar de suas flores, lhe era muito relaxante, algumas árvores frutíferas e água em abundância. Todos que o visitavam, se encantavam com a beleza do lugar e o elogiavam. Um pequeno Paraíso, cercado de montanhas, com diferentes pássaros cantando ao longo do dia. A noite era uma beleza, via-se claramente todas as constelações e nebulosas. Porém…eis que um dia, a paz do pastor foi perturbada por um estranho sonho. Yogod sonha que vende suas ovelhas e vai em busca do seu tesouro. Carrega um mapa na mão, avista uma grande ponte, que faz fronteira com o seu país, numa das pilastras dessa ponte, tem um xis de acordo com o seu mapa, indicando para Yogod, que ali está o seu tesouro. Ele começa a cavar no lugar indicado e finalmente se depara com um baú, todo cravejado com pedras semipreciosas, quando Yogod desenterra o baú completamente, vai abri-lo e ele desperta. Tenta dormir novamente, tentando dar continuidade ao sonho. Nada, tentativa frustrada, não consegue. O sonho que tivera, permanece nítido, a paisagem, o mapa, a ponte, tudo passa com muita precisão na sua cabeça. Ele se levanta e desenha o mapa, exatamente como seu sonho lhe indicou.

A partir desse sonho, o pastor Yogod, já não era mais o mesmo, algo dentro dele se quebrara. Fazia seu labor, pensativo e sem grandes prazeres. Não, definitivamente mudara, já não era mais o mesmo. Tentava em vão interpretar o que aquele sonho estava querendo lhe dizer…sabia que ele era importante, mas não sabia por quê. Yogod disse para si mesmo, que aquilo era apenas mais um sonho como outro qualquer. Tentando desta forma reencontrar a paz perdida, pelas perturbações e turbulências que o sonho do tesouro perdido lhe trouxera. Com o tempo e aos poucos, Yogod foi se entregando à rotina do seu dia a dia, quando estava quase praticamente recuperado, o mesmo sonho se repete, com pequenas modificações, desta vez mais nítido e vívido, do que da vez anterior.

O mapa é o mesmo, a ponte, a indicação do tesouro, o mesmo baú cravejado de pedras semipreciosas, quando ele está desenterrando o baú, tem a nítida percepção, que há alguém sobre a ponte lhe observando. Yogod não consegue ver quem o observa, mas sabe que alguém o faz, ele ignora o seu observador, quando vai abrir o baú acorda novamente, como acontecera na noite do sonho anterior. Yogod fica muito irritado por ter acordado, impaciente e indócil, tenta dormir novamente para dar continuidade ao sonho, quer muito visualizar o conteúdo do baú…nada. Não consegue, rola na sua pequena cama para lá e para cá e isso só o deixa mais irritado e impaciente.

Yogod pega o mapa que desenhara, tendo como base o seu primeiro sonho. Confere mentalmente o mapa do segundo sonho e percebe que os trajetos que fizera, eram exatamente iguais, para chegar à ponte sob a qual estaria o seu tesouro. Desta vez o pastor fica bastante abatido, já que da outra vez, com muito esforço ele conseguiu convencer-se de que aquilo era apenas mais um sonho, como outro qualquer…mas, e agora? O mesmo sonho repetido, pela segunda vez, por mais que ele tentasse não conseguia se convencer que era apenas mais um sonho, ficou deveras abalado. Repetia para si:

-É impossível que esse sonho, não esteja querendo me dizer algo muito importante. Mas o quê? O quê?

Yogod não consegue esquecer os sonhos, estes passam a ser a sua realidade, já que tudo o que ele faz, o sonho, a estranheza que ele causa estão ali presentes e lhe perturbando. Yogod já não tem mais alegria, já não cuida do seu jardim como antes, já não tem disposição de ir para a cidade vender a sua mirrada produção. A sua casa que antes era muito bem cuidada, agora cada vez mais ia ganhando aparência de uma simples cabana. Roupas sujas, louças por lavar, baratas, cupins…Yogod já não conseguia apreciar a paisagem, contemplar a lua e as estrelas. Foi se tornando uma pessoa amarga, nada tinha graça na vida de Yogod, até mesmo o seu rebanho de ovelhas era afetado por seu humor e má vontade.

– Basta! diz Yogod determinado. Isso não pode continuar, tenho que retomar minha vida. O que é isso? Chega de bobagem por causa de sonhos….

Depois de muito tempo e muito esforço, Yogod foi retornando a sua rotina, cuidando melhor do seu rebanho, da sua casa, do seu jardim, foi ficando mais contemplativo, mais presente. Yogod se sentiu como se estivesse se recuperando de uma enfermidade.

-Pronto, agora estou praticamente curado, dizia Yogod, olhando a sua volta. Sem mais nem menos, veio sem aviso o mesmo sonho pela terceira vez…

O terceiro sonho foi exatamente igual aos dois sonhos anteriores, com acréscimos no final. Yogod sonha que vende suas ovelhas, e parte com o velho mapa do seu tesouro nas mãos, encontra a ponte e a pilastra sinalizada com um xis no mapa, cava, encontra o baú cravejado, abre correndo com medo de acordar… E lá está o seu tesouro, seu rosto se ilumina pela luz dos diamantes, outras pedras preciosas e pela luz da sua alegria. Yogod abre o seu melhor sorriso, Puro êxtase… Sem pressa, Yogod fecha o baú que guarda o seu tesouro e acorda…acordou bem diferente desta feita. Animado, Yogod não tem dúvida de que aquele sonho é muito importante para ele. Ao levantar-se naquela manhã, não perde mais tempo. Vende o seu rebanho, alguns pertences, para empreender a sua viagem em busca do seu tesouro, que o espera sob a ponte. Fecha a sua casa e põe o pé na estrada, seguindo o mapa que desenhara. Depois de caminhar por sete dias, Yogod se depara com a ponte, que até então ele não sabia da existência, lá está a velha ponte lhe esperando…é a mesma ponte que lhe aparecera nos seus três sonhos. Yogod identifica a pilastra onde supostamente o seu tesouro está enterrado. Yogod lembrou-se do segundo sonho, que tinha alguém que o observava, agora ficou tudo claro para ele. Tudo fazia sentido, a ponte que faz divisa com o seu país, tem um guarda que caminha para lá e para cá, um vigia de fronteira, que observa aquele andarilho desconfiado. Yogod acampa de olho nos guardas que se revezam.

-Como cavar ao pé da pilastra sem chamar a atenção da guarda? – Parece impossível. Pondera Yogod

Depois de três dias acampado, sem encontrar uma brecha de descuido dos guardas da ponte, para que Yogod cavasse e pusesse as mãos no seu tesouro, ele resolve fazer amizade com um dos guardas, que era mais amistoso. Depois de muita conversa, de muitos chás, Yogod resolve se abrir e compartilhar os seus três sonhos com o guarda que se tornara seu amigo. Quando Yogod acabou de contar o seu sonho que se repetia, motivo pelo qual ele vendera o seu rebanho, e ali estava pronto para botar a mão no seu tesouro. O guarda simplesmente não consegue se controlar, explode em altas gargalhadas. Depois de ficar bem vermelho e chorar de tanto rir diz:

-Desculpe, ainda rindo…eu não devia estar rindo do seu sonho, é que não consegui me controlar….Desculpe.

-Do que você ri? Pergunta Yogod. – Não contei nenhuma piada, apenas lhe contei meus sonhos….

-Desculpe, mais uma vez, tenta o guarda ainda rindo muito. -É que não posso acreditar que você seja tão louco, de abandonar uma vida boa e estável como a que você diz que tinha, para correr atrás de um sonho. O guarda parou de rir, olhou sério para Yogod e diz:

-Vou lhe contar uma coisa tão engraçada quanto a que você acabou de compartilhar comigo:

-Eu tive uma trilogia de sonhos, muito parecidos com os que você acaba de me contar… Há pouco tempo. Muda só a paisagem, no mais é exatamente igual. Parece irônico ou que o destino quer nos pregar uma peça. No meu primeiro sonho, eu dou baixa no quartel e viajo com um velho mapa, por sete dias e encontro o meu tesouro num vale muito bonito, cercado de oliveiras, um jardim muito bem cuidado…as noites são belas, claras, iluminadas pelas estrelas, vejo no meu sonho uma casa azul claro, com portas brancas, uma varanda de onde se pode ouvir o canto da passarada e o murmurar de um riacho. Vejo duas enormes Jaqueiras carregadas de frutas e muitas ovelhas…O engraçado é que o meu sonho indica que o meu tesouro, está aos pés de um velho fogão a lenha, que tem uma cabeceira mais alta. Por dentro do fogão passa uma serpentina que é usada para aquecer a água. Bem, o meu mapa indica que o que eu procuro está enterrado aos pés do fogão, considerando-se que a parte mais alta é a cabeceira. Quando encontro o meu tesouro no primeiro sonho, que consiste numa arca como a que você descreveu no seu sonho, exatamente igual… Quando vou abri-la, acordo. Não posso ver o que há dentro da arca. No segundo sonho repetido….

-Pare! Interrompe Yogod. – Você descreveu a minha casa, a minha paisagem, como você pode saber se eu nunca lhe falei? Pergunta Yogod assustado

-Amigo, isso é apenas um sonho, se coincide com a sua paisagem, talvez seja só uma coincidência…Desenhei o mapa já que no dia seguinte eu me lembrava nitidamente do sonho com cada detalhe…Aí pensei, isso é só um sonho…continuava falando o guarda.

Yogod, já não podia ouvir mais nada do que o guarda dizia…Como é que esse guarda sabe descrever em detalhes, a paisagem que cerca a sua casa? A sua casa… As cores, as portas, as mangueiras carregadas de frutas, as ovelhas, seu fogão com serpentina para aquecer a àgua… Ele jamais comentara nada com o vigia a esse respeito.O pastor deixou o guarda falando sozinho e partiu correndo…

-Ei! Venha cá esse foi só o primeiro sonho, ainda faltam dois para completar a trilogia…Disse o guarda, rindo e sem entender a fuga inesperada de Yogod.

O pastor sabia muito bem, o que o guarda tinha para lhe contar, não podia mais perder tempo, juntou seus pertences às pressas e retornou correndo o mais rápido que podia para a sua casa. Quando chegou muito cansado, na sua casa, cavou no lugar indicado pelo sonho do guarda da fronteira, e ali estava o seu tesouro, exatamente como ele viu no seu terceiro sonho. Uma arca cravejada com esmeraldas, rubis, topázios e outras tantas, o pastor abre a pequena arca e não acredita que acabara de encontrar o seu tesouro. que viajara tão longe, enquanto o seu tesouro o aguardava por todo esse tempo ali mesmo. Yogod se belisca algumas vezes, para certificar-se de que aquilo que está acontecendo é real, e não mais uma peça que seus sonhos estão lhe pregando. Yogod começou a gritar repetidas vezes, feito um verdadeiro louco:

-Estou rico! – jogando seu tesouro para cima…

-Floresça onde você está plantado!